sábado, 4 de janeiro de 2020

Evocando a nova poesia árabe


O CÂNTICO DA MULHER
De lado,
Tinhas o rosto de um homem idoso
Que, assaltado por dias de mágoa,
Me trouxe o seu frasquinho esverdeado
E pedia que tomasse a última refeição.
Esse frasquinho é uma enseada,
O casamento de um barco com uma enseada
Nos dias em que as praias se afundam
E as gaivotas encontram os rostos
E o capitão pressente o seu futuro.
Ele veio cheio de fome até mim, eu dei-lhe o meu amor
Como um pão, como uma bilha, como um leito
E abri as portas ao vento e ao sol
E partilhei com ele a última refeição.

Ana Oliveira, António Gambóias e Rui Afonso

O CÂNTICO DO HOMEM   

De lado
Vi o teu rosto pintado no tronco da palmeira
O sol negro nas tuas mãos
Então montei a minha saudade da palmeira
Trazia a noite num cesto, trazia a cidade às costas
E polvilhei-me à volta dos teus olhos, estudei
O meu rosto
E vi o teu rosto, havia nele a fome de uma criança
E esconjurei-o com fórmulas mágicas
E polvilhei- o com jasmim


Gonçalo Pescada, Ana Oliveira e António Gambóias


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